O Pantanal, maior planície alagável do mundo, é o elo entre as duas maiores bacias da América do Sul: a do Prata e a Amazônica, o que lhe confere a função de corredor biogeográfico, ou seja, permite a dispersão e troca de espécies de fauna e flora entre essas bacias. Está situado na parte alta da Bacia do rio Paraguai a qual possui uma superfície de aproximadamente 500.000 quilômetros quadrados. A planície cobre uma área de quase 210 mil quilômetros quadrados, dos quais 70% estão no Brasil (nos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), 20% na Bolívia e 10% no Paraguai. É uma região única na qual encontram-se o Cerrado (Leste, Norte e Sul); o Chaco (Sudoeste); a Amazônia (Norte); a Mata Atlântica (Sul) e o Bosque Seco Chiquitano (Noroeste). Esta situação, somada aos pulsos de inundação, permite particular diversidade e variabilidade de espécies. A taxa de endemismo é relativamente baixa, porém, conforme exposto, as características múltiplas da região possibilitam a interação entre material genético (animais e plantas) que em outras regiões, não estariam em contato.
Muitas vezes encontramos a denominação "pantanais", pois a planície pode ser dividida em onze sub-regiões distintas, cada qual com especificidades quanto ao regime de inundação, drenagem, vegetação e relevo.
Uma das características marcantes do Pantanal é seu regime de cheias e secas e a relação entre a parte alta da bacia (planalto) e a parte baixa (planície). Na planície a declividade é, aproximadamente, de 1 a 2 centímetros por quilômetro no sentido norte - sul e 6 a 12 centímetros por quilômetro no sentido leste-oeste. Esta situação faz com que região funcione como uma grande "esponja" que, durante o período das chuvas, recebe as águas da parte alta as quais são retidas e escoadas lentamente alcançando o rio Paraguai. Esta situação promove um fenômeno interessante que é cheia durante um período seco: as águas que entraram há meses na planície nas partes mais altas por fim chegam em grande volume na parte mais ao Sul, provocando crescida das águas sem que ocorram chuvas em quantidade suficiente para provocar o fenômeno. Em 2003 isto passou-se durante o mês de agosto, em geral o mês mais seco do ano na região.
A água é "retida" na planície através do transbordamento natural dos rios, forma canais e lagunas ou abastece lagoas permanentes e baias. Assim, na cheia, rios, lagoas e riachos ficam interligados, permitindo o deslocamento de espécies. Este processo é um dos principais responsáveis pela constante renovação da vida no Pantanal e pelo fornecimento de nutrientes. Na época de seca, quando a quantidade de água que chega é menor , o escoamento é lento em direção ao rio Paraguai - a grosso modo. Forma-se então lagoas e corixos isolados, os quais retêm grande quantidade de peixes e plantas aquáticas. Lentamente estes corpos d'água vão secando o que atrai aves e outros animais em busca de alimentos, promovendo concentração de fauna. Coincide em algumas regiões com a florada de várias espécies, provocando cenários de raríssima beleza. Vale lembrar que o Pantanal é uma das áreas mais importantes para as aves aquáticas e espécies migratórias, que usam a região para abrigo, alimentação e reprodução.
Parte de um Sistema.
O Pantanal faz parte do maior conjunto de áreas úmidas do mundo. Este "sistema" com cerca de 400 mil quilômetros quadrados, está localizado do vale central que corre de norte a sul dentro da "Grande Depressão da América do Sul" ou "Depressão Sub-andina" da bacia do Prata. Este sistema se estrutura ao longo de mais de 3.400 km dos rios Paraguai e Paraná (médio e inferior). O Paraguai é um dos poucos rios livre de represas e o Paraná também não ´barrado no trecho indicado. É o segundo maior sistema hídrico da América do Sul - o primeiro é Amazonas - e uma das maiores reservas de água doce do mundo. Aproximadamente 20 milhões de pessoas vivem nesta região o que permite afirmar que constitui uma unidade hidrológica, ecológica, cultural e populacional. Este fato determina a necessidade de manutenção dos ciclos hidrológicos e da conservação da biodiversidade para a sustentabilidade do sistema e sua população
*Alcides Faria é diretor executivo da ong Ecoa (alcidesf@riosvivos.org.br) e Rafaela Nicola é coordenadora do Programa Pantanal da Ecoa (rnicola@riosvivos.org.br).